Guernica é uma obra tão importante que, ao menor movimento em direção à câmera fotográfica, os funcionários correm a avisar gentilmente que é proibido fazer fotos ou vídeos. Cacoete que herdaram do tempo do flash.
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O Museu Nacional e Centro de Arte Reina Sofia, de Madri, não é só, nem principalmente, o local onde se pode ver Guernica, o mural da Picasso, que denuncia a violência da guerra. É um incansável centro de produção de ideias, que está discutindo a reinvenção do documentário num contexto ideológico de crítica do modernismo e suas instituições.
Os organizadores da mostra – que exigiu dois anos de planejamento e pesquisa – argumentam que, antes da segunda guerra mundial e no imediato pós-guerra o documentário fotográfico vivia de seu tom humanista, que teve um ponto alto na grande exposição The Famiy of Man, do Museu de Arte Moderna de Nova York.
As premissas dessa visão foram condenadas como “falsamente conciliatórias”, porque ignoravam a realidade de uma sociedade em conflito.
Em 1978, Allan Sekula (fotógrafo, filmmaker, historiador e crítico americano) publicou um texto incendiário intitulado Dismantling Modernism, Reinventing Documentary. Pede que a arte se torne “um discurso ancorado em relações sociais concretas e não mais manifestações anti-históricas que expressam experiências puramente afetivas”.
O pedido de Sekula, falecido em 2013, foi atendido. Na Europa, nas Américas, na Africa e na Asia apareceram trabalhos sobre a apartheid na Africa do Sul, a Guerra do Vietnã, o conflito na Palestina, no Iraque. Há imagens de conflitos raciais nos EUA e do movimento movimento negro que tem magnífica síntese no filme Selma, infelizmente ignorado pela Academia Cinematográfica de Hollywood, que concede o Oscar.
O Brasil merece uma visita dessa exposição, no mínimo em homenagem aos que continuam batalhando pela causa dos sem-teto. Eles merecem ver If You Lived Here, a resposta artística à crise dos homeless em Nova York, nos anos 1980, um projeto colaborativo de Martha Roslers.