Pesquisas, fatos e artefatos criados pela técnica de convencer

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Entrevistados em pesquisas de opinião pública frequentemente respondem questões sobre assuntos que eles conhecem muito pouco ou nada. Concorda com esta afirmação?

 

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Há brasileiros descontentes com a Constituição de 1988? Representam a maioria da população? Está na hora de escrever uma nova Carta Magna?

As dúvidas são plantadas todos os dias na grande mídia que publica em manchete e sem filtros os resultados das pesquisas de opinião pública. Agora, por exemplo, parece que a maioria do pais parece achar que a Carta oferece um excesso de garantias aos brasileiros. Há quem considere um exagero esperar o trânsito em julgado (art. 5º, inciso 57), para trancar o réu numa cela. É o que informa o repórter Felipe Bächtold, na Folha de S.Paulo.

“A maior parte dos brasileiros apoia a prisão de réus condenados em segunda instância, de acordo com pesquisa do Datafolha. (…) Pesquisa feita pelo instituto dos dias 11 a 13 deste mês mostra que 57% dos entrevistados consideram justo que um acusado seja detido após ter sua condenação confirmada em segundo grau, ainda que possa recorrer a instâncias superiores.” A pergunta não é boa. Para ser boa deveria ser antecedida de uma pergunta-filtro: “Você sabe o que é uma condenação em segundo grau?”

O professor George F. Bishop, autor de “A Ilusão da Opinião Pública: Fato e Artefato em Pesquisas de Opinião”, diz que pesquisas, da maneira como são feitas, constituem fatos ou artefatos ilusórios porque o público é mal informado.

Um caso típico aparece em pesquisa do Instituto Gallup: “Você concorda com o uso de forças terrestres norte-americanas em ações na Libéria?” Na hora, o entrevistado pensa no filho que pode ser enviado à Libéria, aquele lugar quente e poeirento, onde a água de torneira causa cólicas intestinais e o inimigo de turbante branco empunha uma carabina no telhado das casas. E responde não.

Bishop e outros especialistas chamam atenção para o jeito de perguntar (wording). Quem pergunta: “Acha justa a prisão após a condenação em segunda instância?” vai receber uma maioria de respostas afirmativas, até porque grande parte dos entrevistados não sabe o que é segunda instância. Se perguntar “É injusta a prisão antes de o acusado ter direito à ampla defesa?” vai descobrir que o público está favor do artigo 5º, inciso 57, da Constituição.

A forma de perguntar altera a resposta. Quer prova? Saia do ambiente jurídico e entre no supermercado. Note que o caixa, ao receber seu cartão, pergunta: “No débito?” A maioria dos clientes diz sim e paga no cartão de débito, que não oferece milhas de bônus ao usuário mas em compensação cobra ao supermercado uma taxa pequenininha. Se a pergunta fosse outra: “No crédito?” o supermercado pagaria ao cartão Visa cerca de 4% do valor da compra, mas o cliente acumularia 2,2 milhas por dólar gasto.

Por enquanto, a manipulação das pesquisas não afeta o quadro eleitoral. Pesquisa do Instituto Vox Populi, realizada entre os dias 11 e 15 de abril, mostra que o ex-presidente Lula, mesmo depois de ter sido preso, mantém a liderança e até ampliou a vantagem sobre os demais candidatos às eleições de outubro.

Segundo a pesquisa, 41% dos brasileiros consideram que Lula foi condenado sem provas, 44% consideram que a prisão de Lula foi injusta e 58% acham que ele tem o direito de ser candidato novamente à presidência da República, mesmo depois da prisão.

Ah, mas o Vox Populi pergunta de um jeito e o DataFolha de outro…Não sei, ninguém sabe. As pesquisas não são divulgadas na íntegra. Não há como verificar o jeito de perguntar, a ordem das questões, os temas que deixaram de ser apresentados, os artefatos criados em nome da técnica de convencer.

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P.S. – Artefato é algo inventado pelo homem para fins econômicos, culturais ou políticos. A moralidade, que começa a substituir a legalidade, é um artefato de cultura humana, concebido para ajudar na negociação das relações sociais.

 

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