O som da cidade ficou mais pobre – morreu Gebran Sabbag

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Guarani, Gebran e Norton. Ludus Tertius. Não houve melhor.

 

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HAMLET: …o resto é silêncio.

HORÀCIO: Assim, estala um nobre coração! Boa noite, gentil príncipe! Que legiões de anjos te conduzam, cantando, ao eterno descanso!

(William Shakespeare, Hamlet, Principe da Dinamarca)

 

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Maktub, dizem os árabes. Está escrito.

A despeito de tudo o que a sociedade curitibana pensava sobre o músico da noite – boêmio, malandro, ser estranho que dorme enquanto os outros trabalham – Gebran, menino nascido em Rio Negro, seria um deles.  Provavelmente o mais importante, o mais talentoso e o mais difícil de entender. Uma vez alguém falou em destino, ele filosofou: “Somos nós que escolhemos o caminho ou é o caminho que nos escolhe?”

Filho de família tradicional, nasceu para ser médico, engenheiro ou advogado, as profissões de elite. Mas suas paixões não eram as dos bem nascidos. Gostava de eletrônica, aos 9 anos já desmontava rádios, à custa de choques, e montou seu primeiro galena aos 11. A outra paixão era a música, mas – que contradição! – nunca com instrumento eletrônico. Tem que ser acústico, “porque é este o som de Deus”.

Convém explicar que havia música dentro de casa. Gebran tinha discos, revistas, instrumentos musicais. Com os irmãos ouvia o grande jazz dos anos 1930 e 1940. Todos tocavam um pouquinho. Omar Sabbag, que depois foi prefeito de Curitiba, passou pelo violão e pelo piano. Uma irmã estudava violino. Outras duas, piano, o instrumento da moda. Havia centenas de Essenfelder, fabricados na cidade; e muitos Schneider, uma dissidência da Essenfelder. E Fritz Dobbert, produzidos em São Paulo. E Steinway importados dos Estados Unidos, privilégio de poucos. Com tantos pianos nas casas, só faltava mudar o nome da cidade: Pianópolis.

Provou do violão, da gaitinha de boca e acabou encontrando tudo que queria no piano.  Mas, não como diletantismo, complemento da formação cultural.  O piano virou profissão para o resto da vida, liturgia – e isso era proibido. Nos anos 1950, músico era um verme, daqueles que moram debaixo da pedra. Para o pai, a mãe, os irmãos, foi doloroso. A família não estimulou, muito ao contrário.  Ele foi aprendendo como pode.

Começou com um método para piano que encontrou no sótão da casa do primo Alfredo, em Rio Negro. O teclado e a posição dos dedos. “Ah, foi um prato cheio. Podia acompanhar um monte de músicas só com aqueles acordes.” Logo, aquilo deixou de ser suficiente e procurou mais. Em 1951, com 19 anos, encontrou Waltel Branco.

Gebran no piano, Waltel na guitarra, mais o baixista Dario começaram tocar juntos, nos shows do Clube dos Desesperados, um time de boliche do Curitibano. Depois virou profissional, criou um trio fantástico com Norton Morozowicz no baixo e Guarani Nogueira na bateria. O Ludus Tertius era  jazz de altíssimo nível, talvez nunca igualado. A carreira prosseguiu em Curitiba. Luizinho Eça, com quem tocou em memorável jam session em sua casa no bairro do Ahu, insistiu em levá-lo para o Rio de Janeiro, onde o bebop explodia no Beco das Garrafas. A resposta foi não, não e não.

Ninguém foi mais curitibano do que Gebran Sabbag. Nem o Dalton Trevisan.

 

 

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