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Em inglês o adjetivo sweeping quer dizer largo, profundo, esmagador, decisivo. O New York Times diz que o povo grego deu uma sweeping vitória ao premier Alexis Tsipras no plebiscito de ontem. Ele chegou ao poder com o compromisso de rejeitar novas medidas de austeridade fiscal, como o corte de pensões de aposentados ou o afrouxamento ainda maior da legislação trabalhista. Tem o apoio dos gregos para continuar fazendo isso.
Paul Krugman, prêmio Nobel de Economia e analista do NYT, avalia que a vitória do “não” a novas medidas de austeridade encerra uma longa campanha de bullying — a tentativa de aterrorizar os gregos pelo corte do crédito bancário e a ameaça de caos generalizado “tudo com o objetivo bem claro de expulsar do governo a frente de esquerda que venceu as últimas eleições”.
Krugman não tem dúvida de que a solução é errada. Os médicos da Idade Média receitavam sangrias para curar seus doentes, que pioravam ou morriam do remédio. Com a economia é a mesma coisa. A austeridade encolhe a economia muito mais do que reduz o débito do governo.
Alguma semelhança com o que está acontecendo com a Dilma e o Partido dos Trabalhadores? Aqui, as medidas austeras do ministro Joaquim Levy conseguem derrubar o PIB, aumentar o desemprego, reduzir a arrecadação de impostos, desestimular investimentos industriais. Com a Selic de quase 15% ao ano só ganha o setor financeiro.
Alguma parecença com o que faz o governo do Estado do Paraná ao lançar uma contribuição inconstitucional de 11% sobre o salário dos aposentados? Menos dinheiro em circulação significa menos compras no comércio, menos encomendas à indústria, mais desemprego e queda na arrecadação. Vai continuar faltando gasolina nos carros da Polícia Militar. E vai aumentar a corrupção, como acontece em qualquer governo sem capacidade de investir em segurança.
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A Grécia, como o Brasil, padece da doença da corrupção endêmica. Sob o título “Campo minado político”, The Economist publicou em 20 de fevereiro de reportagem responsabilizando ONGs por boa parte da corrupção “Uma então próspera Grécia ofereceu 600 milhões de euros como ajuda aos vizinhos. Dos 87 milhões de euros entregues às ONGs, cerca de 30 milhões sumiram da contabilidade enquanto George Papandreou era primeiro-ministro.
O principal acusado, o antigo diretor Kostas Tzevelekos, agora trabalha para o jornal do partido socialista Pasok, de propriedade de Papandreou. Três diplomatas ligados ao Hellenic Aid foram parar na cadeia. Entre eles estava Alex Rondos, principal conselheiro do governo para assuntos balcânicos.
O governo caiu. O sucessor Alexis Tzipras tinha a missão de limpar a casa e acertar as contas. Não conseguiu. The Guardian de 3 de dezembro do ano passado publica reportagem de Helena Smith contando que em um hospital de Atenas o elevador quebrou. Chamada para consertá-lo, a equipe de manutenção descobriu no fundo do poço centenas de envelopes contendo propinas para os médicos atenderem os pacientes.Os envelopes, chamados fakelakia, são testemunhas de que o velho sistema de suborno a funcionários não desapareceu como se imaginava.
(Aqui em Curitiba, a polícia descobriu que médicos do Hospital das Clínicas, entre eles um vice-reitor, ganhavam sem aparecer no serviço; seus pacientes tinham de consultá-los nas clínicas particulares.)
O Estado grego sofre com o alto nível de evasão de impostos. Funcionários corruptos obtém do Congresso e do estamento burocrático mais leis e regulamentos para complicar a vida das empresas e até dos turistas, principal fonte de arrecadação nacional. Quanto mais regulamento, mais pretexto para vender facilidades, qualquer brasileiro sabe.
Aprofundar a crise com novas exigências de austeridade fiscal só vai piorar a capacidade de o governo vencer a corrupção. O Guardian diz que é a própria estrutura da economia que facilita a corrupção. “É uma economia dominada por poucas grandes empresas o que significa ausência de competitividade e muito espaço para relações ilícitas entre setores do governo e o big business”, diz Kevin Featherstone, professor Estudos Gregos Contemporâneos na London School of Economics.
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A grande pergunta que Krugman faz e que também os brasileiros precisamos responder é: “Será que a eventual saída do euro funcionará para a Grécia como a bem sucedida desvalorização da moeda feita pela Islândia em 2008-2009? Ou como o abandono pela Argentina da política de um peso=um dólar em 2001-2002?”
Talvez não, ele pondera, mas é preciso considerar as alternativas. A menos que a Grécia ganhe um alívio real em seu débito deixar o euro significa a única rota de fuga possível para um infindável pesadelo econômico.