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Como falta pouco para a eleição e a Boca Maldita foi invadida pelos políticos lembrei de Takesha Meshé Kizart.
Ela é uma das grandes sopranos do mundo. Devia ser jazzista. Sobrinha-neta de Muddy Waters e prima de Tina Turner, tem uma voz de ouro, geralmente colocada a serviço de Giacomo Puccini, interpretando a Tosca.
Consegui dois lugares na Opera de Frankfurt para o espetáculo. Eram lá no fundo, mas a distância não faz muita diferença, mais importante é ouvir.
Então chegou o cara. Andrajoso, com pavoroso bodum, cabelo grudado, barba por fazer. E odor de quem jamais toma banho e bebe todos os dias.
Um cheirão de derrotar qualquer estômago.
Fui trocar uma ideia com o porteiro. Logo chegou outro funcionário da Noie Oper, com jeitão de gerente.
Ouviram, foram gentis, mas informaram que ninguém, com um ingresso na mão, é barrado na ópera .
E que infelizmente não havia outros lugares. Tudo vendido.
É de entusiasmar o espírito democrático dos alemães. Foi uma pena abandonar a Tosc. E fiquei sem saber onde a senhora do lado de lá e os outros vizinhos tinham comprado o nariz de ferro deles.
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Voltamos a Curitiba e à eleição.
Encontrei a sub-secretária de Saúde discutindo a questão da droga sob um cirquinho onde estava escrito Secretaria Anti-Drogas. Um microfone transitava democraticamente pela mão de trinta e poucos participantes.
Como participavam da grande roda representantes da universidade, dos AA e NA, de associações benemerentes, deixa de ser propaganda política.
Mas é estranho que o interesse pelos sem-teto, bêbados e craqueiros torne-se tão intenso em certas épocas. Uma senhora chegou e avisou, mesmo sem acesso ao microfone:
-Um viciado está em surto ali na esquina. Ninguém vai fazer nada?
Não recebeu atenção. Afinal, o problema era falar da droga e não atender drogados em crise.
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