logo
Governo e política, crime e segurança, arte, escola, dinheiro e principalmente gente da cidade sem portas
post

Um herói trágico e seu pensamento excessivo

.

nnmnmn Guardiola na derrota ante o Lyon. (The Guardian)

 

Se um time pequeno perde, normal. Pequenos lutam para não cair.

Mas se for grande, principalmente se for inglês e especialmente se for o Manchester City, bancado pelo sheik Mansour bin Zayer Al-Nahyan, cuja fortuna é superior a um trilhão de dólares, a derrota é trágica.

O City está fora da Champions League. Perdeu sábado para o Sevilha com alguns dos principais jogadores no banco.

Pior: perdeu sem glória, jogando na defensiva, mesmo tendo um elenco superior e sob a direção do melhor técnico do mundo.

Suspeita-se que Pep Guardiola pensou demais. E inventou de jogar no esquema rope-and-dope.

Essa estratégia vem do boxe. Ficou famosa por causa do campeão Mohammed Ali, que a utilizou na luta contra George Foreman, em 1974. Ali encostou-se nas cordas (ropes) e chamou o adversário. Foreman bateu, bateu, mas boa parte da força dos socos era absorvida pelas cordas elásticas. No quinto round cansou e no oitavo levou uma saraivada de golpes até o nocaute (dope).

Durante dias e noites intermináveis no hotel de Lisboa, onde o City aguardava a hora de jogas contra o Lyon, 7º colocado no campeonato francês, Pep Guardiola pensou. E chegou à conclusão de que dava para vencer sem alguns titulares, que ajudariam na partida final, provavelmente contra o Bayern de Munique.

Até dá para entender o rope-and-dope transposto para o futebol. O Corinthians de Tite e de Carille jogava assim. Os técnicos de clubes menores repetem: “Tem que sofrer na defesa, cansar o adversário, e ganhar em um contra-ataque rápido.” Jogam por uma bola.

O Manchester City esbanja craques. Guardiola sabia o risco de tomar um gol inesperado e não conseguir virar. Mas queria chegar inteiro à grande final da Champions, que não conquista desde 2011.

“Há algo de arquetípico nesse drama”, analisou o jornalista esportivo Jonathan Wilson (*) no Guardian. “Vemos o gênio atormentado pelo desejo desesperado de vencer um torneio. Isso é tragédia grega – o herói não apenas incapaz de escapar de seu destino, mas inadvertidamente construindo as circunstâncias da derrota. É também budista: o desejo leva ao sofrimento e apenas na ausência de sofrimento pode-se chegar ao nirvana.”

E conclui: “A má sorte de dez anos seguidos desenvolveu a tendência ao pensamento excessivo.”

 

*

 

(*) Jonathan Wilson é autor de 11 livros, entre eles a “Pirâmide Invertida – A História da Tática no Futebol”. A boa tradução é de André Kfouri.

 

Posted on 17th agosto 2020 in Sem categoria  •  No comments yet

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *